27.2.08

Belly - Star (1993)


Quem nunca teve uma banda de rock? Quem nunca tentou montar uma banda de rock? Quem nunca teve um amigo que ao menos começou a tocar guitarra?

Pois eu tive uma banda, lá pelo ano de 1993, com uns vizinhos meus. Eu tocava bateria, o Daniel Arroyo tocava guitarra e o Felipe, irmão dele, teclado. Haviam também dois irmãos malucos que moravam no prédio do lado, que eram os mais metaleiros do bairro e tocavam violão na missa de domingo. Pode?

Na época, a gente só ouvia Metallica, Iron Maiden e Megadeth. Cada dia, um de nós chegava ou com um disco de heavy metal novo ou uma espinha nova. Era assim, disputávamos quem tinha mais discos ou espinhas.

Só que na hora de formar um repertório pra banda, nada de Iron Maiden. Não lembro quem foi que apresentou um disco que balançou nossos corações de metal e fez diminuir as nossas espinhas. O disco se chamava Star e era de uma banda chamada Belly.

Foi amor a primeira ouvida! Era o nosso sonho. Nossa banda de espinhudos com uma gatinha como a Tanya Donelly no vocal. Que voz! Que refrões!! Era tudo que queríamos pra nossa vida rockeira.

A história do Belly se confunde com o The Breeders, que ficou conhecida por aqui com a música Cannonball. Quando deixou sua primeira banda, a Throwing Muses, Tanya Donelly formou o Breeders com sua amiga Kim Deal, que tinha 'dado um tempo' com o Pixies. Enquanto estava com o Breeders, Donnely resolveu criar o Belly. Não é bonitinho?

O estilo das bandas é parecido, e fica clara a influência do Pixies em todas elas. O que não é problema, pois são todas muito boas e cada uma marcou bem seu território. O território do Belly se fez valer pelo Star, disco de estréia que rendeu à banda a três indicações do Grammy naquele ano.

Após uma entrada dark-fofa com Someone To Die For, o disco mostra pro que veio com Angel, e quebra tudo de vez com Dusted, um dos pontos altos de Star. Outro cover que nós, os espinhudos, faziamos era de Slow Dog. Lembro que a MTV usava essa música na abertura de um dos seus programas, imitões. Low Red Moon é outra que vale a pena, com riffs mais pesados, diferente dos outros hits do disco. Bela composição.

Mas a música que teve mais sucesso foi Feed The Tree, que tem um início poderoso e depois cai pra uma levada pop e um refrão que as meninas adoram, dando bronca no namorado. O fato é que a música caiu no gosto do público e e entrou no top 40 britânico daquele ano.

Star tem algo de Cowboy Junkies e Cocteau Twins, sem perder a pegada indie-rock. Foi o melhor que o Belly realizou, o que não é pouco. 3 anos depois a banda terminaria devido ao fraco retorno de King, o segundo disco. Os espinhudos também, terminaram a banda antes do primeiro show, pra delírio dos vizinhos. Só o Daniel que continua destruindo tudo com sua Ogiva.

E Tanya Donnely segue com sua carreira solo e a gente segue fã do Pixies, do Breeders e ouvindo Belly.



Star (1993)

01. Someone To Die For
02. Angel
03. Dusted
04. Every Word
05. Gepetto
06. Witch
07. Slow Dog
08. Low Red Moon
09. Feed The Tree
10. Full Moon, Empty Heart
11. White Belly
12. Untogether
13. Star
14. Sad Dress
15. Stay

23.2.08

Lucas Santtana - Eletro Ben Dodô (2000)


Imaginem uma sessão de estúdio com Fela Kuti, Jimmy Hendrix, James Brown, Bob Marley, Chico Science e Dodô, o criador do Trio Elétrico. Parece sessão espírita, eu sei. Mas estamos em Salvador, então é possível isso acontecer. Se todas essas entidades se reunissem e tivessem que escolher um único representante nesse mundo, esse cara seria o Lucas Santtana.


Em 1994, quando lançaram o Acústico do Gilberto Gil, pouco se notava um tímido flautista, de camisa branca e um corte de cabelo comportado. A impressão que ficou foi de um músico impecável, erudito em todos os aspectos. 6 anos depois, essa impressão se transformaria com Eletro Ben Dodô, a estréia solo do “escolhido”.


Se hoje sua obra-prima 3 Sessions in a Green House está em alta, seu início de carreira não é menos brilhante. Eletro Ben Dodô deixou muito gringo de queixo caído e fez a gente coçar a cabeça pra tentar entender o que ouvia. Eu fui um deles. Apesar de gostar do disco desde a primeira vez que ouvi, só após uns anos algumas fichas foram caindo.


De cara, um aviso. Se você tem o preconceito pequeno-burguês paulistano contra guitarras da Bahia, azar o seu. Lhe aconselho a deixar o preconceito de lado e fazer uma boa viagem.


Alguns diriam que Eletro Ben Dodô deveria vir com um manual, ou um glossário, pra explicar todas as suas referências. Mas não precisa. Reclame 302, a vinheta de abertura, já mostra qual a genética de Lucas, e abre o caldeirão de ritmos que vão se alternando durante o disco.


A lição continua com E Muito Mais, faixa auto-explicativa que ajuda os leigos a entenderem melhor o que está dentro dessa mistura. Passada a parte mais teórica, vamos à aula prática.


Doing it to Death define em sons o que é o conceito do disco. Se trata de um dub tropicalista da música de James Brown, algo como se o gênio do funk viesse pra Bahia pra ser batizado pelo seu Pai-de-Santo. Genial.


Após as lições, a hora do recreio. Aí é relaxar com o tom bem humorado de Deixe o Sol Bater – faixa regravada em 3 Sessions. Inho, Inho tem um quê de dance music, e claro, há o carnaval. Domingo no Candeal e Jimmy Gandhy chamam o povo pra rua e colocam mais temperos pro caldeirão. E como carnaval sem namoro não existe, cabe espaço pra De Coletivo ou de Metrô e a balada de Herbert Vianna, Mensagem de Amor.


No final da aula, vale passar por Enrolado Fio Preto, que é uma revisão do que estudamos nas músicas anteriores, tira as dúvidas que ficaram e profetiza a lição pra próxima aula, de que o balanço pop não vai cair.


E não caiu mesmo. Pra mim, Lucas Santtana se tornou o melhor artista solo em atividade no Brasil, pelos discos e pelo posicionamento ideológico sobre produção musical nos dias de hoje. Impossível tentar analisar um disco seu fora desse contexto e isolado do outro. Eletro Ben Dodô é apenas a sua primeira cartilha. Tire uma xerox da matéria e passe de ano sem recuperação.



Eletro Ben Dodô (2000)

01. Reclame 302
02. Deixe o Sol Bater
03. Inho, Inho
04. Domingo no Candeal
05. De Coletivo ou de Metrô
06. Itapuã @no 2000
07. Doin' it to Death
08. Mensagem de Amor
09. E Muito Mais
10. Jimi Gandhy
11. Funky Bahia
12. Festejo

20.2.08

The Police - Outlandos d' Amour (1978)


Descendentes do punk, simpatizantes do reggae e com levadas pop-rock. O início do The Police tem um pouco de tudo isso, e mesmo o grupo não sabendo muito bem qual era a sua praia, fazia a lição de casa muito bem feita.

Após o lançamento de três demos, o trio produziu Outlandos d' Amour no melhor estilo independente, sem produtor, sem selo ou gravadora. Apenas poucos meses antes do disco ser lançado que o selo A&M Records contratou o grupo.

Se logo no lançamento as rádios britânicas torceram o nariz, depois tiveram que se render aos talentos de Gordon Sumner, Andy Summers e Stewart Copeland. O fato é que o disco de estréia do Police se tornou um sucesso e abriu o caminho para uma das mais bem sucedidas carreiras da história da música.

Dizer que algumas da faixas do disco entraram pra discoteca básica do rock é cair no óbvio. É o caso das veneradas So Lonely e Roxanne. Porém, se engana quem pensa que são as únicas que valem a pena.

Sou meio suspeito pra falar, pois Outlandos d' Amour foi um dos primeiros sons mais 'pesados' que ouvi, quando tinha uns 7 anos de idade. Meu tio Hélio não parava de ouvir sua fita k7 e foi impossível não viciar, até nas mais desconhecidas do disco, como o poema surf Be My Girl - Sally.

Outras pouco conhecidas, mas excelentes são Masoko Tanga - onde Sting já dava os primeiros passos pro idioma usado em De do do do De da da da, e a quebradeira Hole in My Life, uma das inúmeras aulas de bateria que o mestre Stewart Copeland dá ao longo de todos os discos do Police.

Existem outras faixas poderosas, como a pancada de abertura Next To You, e a também pancada Truth Hits Everybody. Outro destaque é o discurso politizado de Born in the 50's, com o Sting soltando a voz até ficar rouco.

Mas a minha preferida é Can't Stand Losing You. O baixo da abertura, a métrica dos versos e os riffs mais pesados no refrão são o exemplo perfeito do conceito da banda, que seria consolidado no disco seguinte. É o reggae de branco, pra jamaicano nenhum botar defeito.

Quem conhece a banda apenas dos tempos de Every Breath You Take e pra quem gostou do show do The Police no Maracanã ano passado, vale conhecer melhor os primeiros momentos do trio.

Se você não se empolgou muito com a performance dos caras no show, como eu, está aqui a explicação.


Outlandos d' Amour (1978)

01. Next To You
02. So Lonely
03. Roxanne
04. Hole In My Life
05. Peanuts
06. Can't Stand Losing You
07. Truth Hits Everybody
08. Born In The 50's
09. Be My Girl - Sally
10. Masoko Tanga

18.2.08

Cowboy Junkies - The Trinity Session (1988)



Existe o caos, e no caos também existe o belo.

Quando vi Natural Born Killers pela primeira vez, tive um furacão de sensações, a maioria caótica e agitada, obviamente. Como não poderia deixar de ser, virei fã de Mickey e Mallory Knox na hora. Mas em meio à saga homicida do casal de vilões mais apaixonante do cinema, havia espaço para um achado suave e doce. Esse achado foi o Cowboy Junkies.

O cultuado grupo canadense de folk rock tem como trunfo uma sonoridade leve, perfeita para a voz sedosa de Margo Timmins, que acompanhada dos irmãos Michael e Peter, visitam o blues e o country com muita propriedade. É a trilha sonora ideal pra viajar pro meio do mato, esquecer do mundo e namorar bem tranquilo.

The Trinity Session, disco que tornou o grupo conhecido mundialmente, é considerado até hoje o seu melhor trabalho. O nome veio da sessão única de gravação na Holy Trinity Church de Toronto, feita no final de 1987 com apenas um microfone para toda a banda. O produtor Peter Moore convenceu os responsáveis pela igreja de que seria a gravação de um especial de Natal para uma rádio, e que o nome do grupo era "The Timmins Family Singers".

Santa idéia! Os padres caíram no conto, a banda foi pra igreja gravar e o resultado é uma textura aveludada como a de um LP antigo, agradabilíssima aos ouvidos, com uma aura que seria inviável se fosse feita em estúdio. De todo o disco, apenas Mining for Gold não foi gravada nesse dia. Moore e Margo aproveitaram um intervalo do ensaio da Orquestra Sinfônica de Toronto no local para gravá-la à capela, dias depois.

Com uma atmosfera bucólica, o disco tem momentos autorais imperdíveis, como I Don't Get It e as belas 200 More Miles e Misguided Angel. Mas são nas caprichadas versões de clássicos americanos que The Trinity Session fez sua fama. I'm So Lonesome I Could Cry é de autoria do pai da country music, Hank Williams, e já foi gravada por artistas como Johnny Cash, Al Green e Elvis Presley. Outra faixa que vale o disco é Walking After Midnight, que ficou conhecida na voz de Patsy Cline. Mais um standard americano, Blue Moon tem aqui uma homenagem com uma nova letra feita por Margo e Michael Timmins e com o refrão eternizado por Elvis. Uma das melhores do disco.

Porém, nada supera Sweet Jane, versão definitiva do rock de Lou Reed, que aqui se transformou em uma balada irresistível e embalou as viagens dos anti-heróis de Assassinos por Natureza. Se ela foi capaz de amolecer o coração do casal Knoxville, imagine o que vai fazer por você.

Pra ouvir com a luz apagada e bem acompanhado.


The Trinity Session (1988)

01. Mining For Gold
02. Misguided Angel
03. Blue Moon Revisited (Song For Elvis)
04. I Don't Get It
05. I'm So Lonesome I Could Cry
06. To Love Is To Bury
07. 200 More Miles
08. Dreaming My Dreams With You
09. Working on a Building
10. Sweet Jane
11. Postcard Blues
12. Walking After Midnight

14.2.08

Titãs - Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas (1987)


Após o sucesso de Cabeça Dinossauro, os Titãs tinham a missão de manter a reputação do grupo em alta. Os fãs esperavam um trabalho capaz de manter no chão todas as estruturas sociais que haviam sido destruídas com o Cabeça.

De fato, eles conseguiram manter a escrita. Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas manteve a sonoridade pesada da banda, inovou ao usar elementos eletrônicos e emplacou hits contestadores. Daqui saíram sucessos como Lugar Nenhum, Desordem e Comida, faixa que dois anos depois daria impulso à carreira de uma novata cantora chamada Marisa Monte.

Diversão foi outra que estorou nas rádios, e vale destacar que foi através dela que revisitei o disco, por um motivo no mínimo inusitado. Na época de faculdade, tive que estudar a sua letra para uma prova de sociologia! A música era - e ainda é - uma evidência pontual da cultura do imediatismo, das relações efêmeras e superficiais que tomam conta dos indivíduos, estejam eles "lúcidos" em suas aflições ou felizes após mais uma cafungada na festa do apê. Tudo isso caiu na prova, mas com os Titãs no caderno da escola, até eu virei CDF. Nunca mais esqueci a matéria!

O lado mais experimental e questionador em concepção de melodia e letra está em Todo Mundo Quer Amor, Nome aos Bois e na faixa que dá título ao disco, com seu verso único que seria simples, não fosse a sua profundidade. Jesus realmente não terá dentes, se seus discípulos assim não quiserem. E você, quer?

Ainda sobra espaço para - a minha favorita - Corações e Mentes, um visceral retrato da luta eterna entre razão e emoção. É digna de um roteiro de cinema. Tem tudo que o grande público adora: amor, ódio, violência, corações perdidos e a inevitável crença das mentes separadas.

Lembremos que o disco foi concebido há 21 anos, o que faz de Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas um trabalho atemporal, que consegue transformar roqueiros alucinados em filósofos existencialistas, e fazer a turma do fundão da classe tirar nota 10 na prova.

Ouça o disco e elabore sua tese de sociologia também.


Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas (1987)

01. Todo Mundo Quer Amor
02. Comida
03. O Inimigo
04. Corações e Mentes
05. Diversão
06. Infelizmente
07. Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas
08. Mentiras
09. Desordem
10. Lugar Nenhum
11. Armas Pra Lutar
12. Nome aos Bois
13. Violência (Bonus Track)

12.2.08

Wayne Shorter - Native Dancer (1974)




Na década de 70, o saxofonista Wayne Shorter explorava novos rumos em sua carreira, após temporadas como integrante do Jazz Messengers, do baterista Art Blakey, e do Miles Davis Quintet. Cansado dessa chatice toda - tocar com Art Blakey e Miles Davis devia ser muito chato, não é mesmo? - Shorter formou o Weather Report, grupo que revolucionou o jazz e fundiu a cabeça dos críticos musicais. Diversos gêneros foram criados para definir o trabalho do grupo, como progressive-jazz, jazz-rock, ou ainda o ultrapassado modern-jazz.

Acontece que no Weather Report havia um brasileiro. Era o percussionista Airto Moreira, já radicado nos EUA com sua esposa, a cantora Flora Purim. Através dele, Wayne Shorter tomou conhecimento do trabalho de dois jovens compositores brasileiros: Lô Borges e Milton Nascimento, que acabavam de lançar o Clube da Esquina.

Foi o suficiente pra Shorter tirar uma folga do Weather Report e convidar Milton Nascimento, Herbie Hancock, Robertinho Silva, Wagner Tiso e o próprio Airto Moreira para gravar Native Dancer, até hoje considerado um dos mais importantes discos do saxofonista.

E não é pra menos. Native Dancer possui acima de tudo, faixas bonitas, com uma leveza e profundidade de arranjos capazes de agradar do tiozão do american bar ao fã de Pink Floyd. O entrosamento dos músicos é total, e fica difícil acreditar que Wayne Shorter e Herbie Hancock não são mineiros. Uai sô!

O resultado é uma unidade belíssima, do começo ao fim. Desde a capela inicial de Ponta de Areia, até a suave Joanna's Theme, de Hancock, tudo flui naturalmente. Milagre dos Peixes, From The Lonely Afternoons e Lilia são os pontos altos do disco e se alternam com momentos mais introspectivos, como Tarde, Diana e Ana Maria.

O disco abriu os olhos do mundo para os membros do Clube da Esquina, foi aclamado por músicos internacionais e fundiu mais um pouco a cabeça dos críticos, que depois de ouvirem Native Dancer criaram mais um gênero, o World Fusion, seja lá o que isso signifique. Melhor mesmo é ouvir o disco, sem se importar com estilos.


Native Dancer (1974)

01. Ponta de Areia
02. Beauty and the Beast
03. Tarde
04. Miracle of The Fishes (Milagre dos Peixes)
05. Diana
06. From the Lonely Afternoons
07. Ana Maria
08. Lilia
09. Joanna's Theme

9.2.08

Linton Kwesi Johnson - Bass Culture (1980)



Foi num feriado de 1995, numa volta por Copacabana com os amigos-irmãos Paulão e Augusto, que conheci o poeta jamaicano Linton Kwesi Johnson. Não sei se foi a brisa do mar, mas pirei o cabeção no momento em que ouvi o Bass Culture. Pedi pro Paulão repetir o som, e o disco está no "repeat" até hoje!

Johnson - pros íntimos, LKJ - nasceu no berço do reggae, mas foi em Londres que ele desenvolveu sua veia artística e seu engajamento político. Em meio às tensões típicas do violento bairro de Brixton, LKJ publicou seus primeiros poemas em 1974, no jornal Race Today. Ele também foi membro do movimento Black Panther, mas seu ativismo era praticado através de sua literatura e de seus discos.

E que discos! Em parceria com o produtor Dennis Bovell, LKJ musicou seus poemas de forma brilhante e se tornou um dos principais nomes do Dub Poetry.

Bass Culture é a melhor expressão do gênero. Bases de baixo espetaculares permeadas com frases marcantes de metais e guitarras formam a trilha sonora para os poemas de Linton. O resutado é irresístivel. Nas letras, críticas ácidas, indignação e até uma leitura com arranjos desconexos - a la Jim Morrison - dão forma a essa Cultura.

O disco começa arrebatador, com Bass Culture, uma pedrada sem refrão que pode mudar sua vida. Street 66 mantém o bom nível com sua atmosfera de crônica policial. Qualquer semelhança com "Um Homem na Estrada", dos Racionais MC's é mera coincidência.

Reggae Sounds
é bem conceitual, repleta de colagens muito bem executadas e descrita como o ritmo de uma tempestade tropical e elétrica. O lado politizado do disco fica por conta de Reggae Fi Peach, feita em homenagem ao ativista Clement Blair Peach, morto em 1979 pela polícia inglesa em uma manifestação de rua, e Inglan is a Bitch, cujo título explica bem a "satisfação" de LKJ com as desigualdades sociais no país.

Loraine, uma das minhas preferidas, é o romance. Imagine você, gatinha, ouvindo seu pretendente lhe falar ao pé do ouvido: "whenever it rains, i think of you..." em meio a uma levada cheia de segundas intenções. Impossível resistir. Se Barry White fizesse o seu famoso xaveco em reggae, essa seria a música.

Quem já conhece o Linton Kwesi Johnson, sabe do que eu estou falando. Se você nunca ouviu falar, pode ir na fé. Seu reggaezinho básico nunca mais será o mesmo.


Bass Culture (1980)

01. Bass Culture
02. Street 66
03. Reggae Fi Peach
04. Di Black Petty Booshwah
05. Inglan is a Bitch
06. Loraine
07. Reggae Sounds
08. Two Sides of Silence

8.2.08

Sublime - Robbin' The Hood (1994)


Eu lembro como se fosse ontem do dia em que minha amiga Mima, hoje maquiadora de celebridades, me apresentou uma fita K7 de uma banda que viraria uma febre entre nossos amigos e deixaria meus outros discos morrendo de inveja. Estávamos em 1994, não queríamos saber de nada e éramos metidos a rebeldes. Não sei por quê, nem onde isso iria nos levar, mas seja lá onde fosse, seria ouvindo Sublime.

Como no post anterior, o local é a Califórnia, mas agora nos anos 90, dos skatistas e surfistas. O movimento hip-hop se misturava com o punk, o ska e o reggae, e a melhor tradução dessa mistura era o Sublime. O trio esbanjava técnica e criatividade para explorar todos esses ritmos de maneira às vezes trivial, às vezes inusitada, mas sempre com qualidade e acima de tudo, se divertindo.

Robbin' The Hood, o segundo disco da banda, mostra bem isso. Recheado de colagens e vinhetas que lembram filmes antigos americanos, o disco é um mar de referências. Tem batidas clássicas de hip-hop (Q-Ball), uma versão rap (Cisco Kid) de When The Music's Over, do Doors, além de surf music, blues e várias outras surpresas espalhadas ao longo das faixas.

Não deixe de conferir Greatest Hits, Saw Red - com Gwen Stefani nos vocais, antes da fama - e Free Loop Dub. Atenção também para Steppin' Razor, reggae clássico de Joe Higgs, que ficou famosa na voz de Peter Tosh. Aqui, a faixa é no mínimo engraçada, no melhor estilo Latino - o gênio da festa do apê.

Por fim, as duas versões de Pool Shark. A original, uma pedrada hardcore de menos de um minuto, e a acústica, bela balada onde um melancólico Brad Nowell anuncia seu caminho rumo à overdose de heroína que o tiraria dos palcos dois anos depois. "One day i´m gonna lose the war".

Assim como a empolgação rebelde da minha turma, o Sublime também não durou muito. Mas que esse tempo foi emocionante, isso foi. Ouça o disco e saiba por quê.


Robbin' The Hood (1994)

01. Waiting For Bud
02. Steady B Loop Dub
03. Raleigh Soliloquy Part I
04. Pool Shark (Original)
05. Steppin' Razor
06. Greatest Hits
07. Free Loop Dub
08. Q-Ball
09. Saw Red
10. Work That We Do
11. Lincoln Highway Dub
12. Pool Shark (Acoustic)
13. Cisco Kid
14. Raleigh Soliloquy Part II
15. STP
16. Boss DJ
17. I Don't Care Too Much For Reggae Dub
18. Falling Idols
19. All You Need
20. Freeway Time in LA County Jail
21. Mary
22. Raleigh Soliloquy Part III

7.2.08

Jefferson Airplane - White Rabbit & Other Hits (1990)


O Jefferson Airplane é a pedra fundamental do rock psicodélico americano. Criado em 1965, o grupo é referência obrigatória quando se fala na cultura Flower Power e se tornou a trilha sonora do amor livre e da expansão das mentes na década de 60. Até hoje, quando vemos representações de hippies em meio a cenários coloridos e viajantes, acredite: foi o Jefferson Airplane quem iniciou tudo isso.

Com discos sugestivos como Surrealistic Pillow (1967), Crown of Creation (1968) e Volunteers (1969), o Jefferson Airplane derreteu a sociedade americana, embalou o engajamento pacifista durante a Guerra do Vietnã e teve seu ápice no Festival de Woodstock, bradando seu refrão mais famoso: "Feed your head"!

Me lembro a primeira vez que vi o clipe de White Rabbit, foi arrebatador. A ponto de achar a vocalista Grace Slick, hoje uma sessentona, a maior gata do rock. Será que eu estava viajando também?

Aqui, uma coletânea remasterizada em 1990 pela RCA, antiga gravadora da banda, já sob a tutela da BMG. O disco é rápido, com apenas oito faixas. White Rabbit é obrigatória, pra mim uma das melhores músicas de todos os tempos, regravada por gênios como George Benson e Patti Smith. Apesar dos 2 minutos e meio da faixa, ela pode levar você ao país das maravilhas por muito mais tempo.

Somebody to Love
e Volunteers também cansaram de aparecer em regravações e trilhas sonoras de diversos filmes famosos.

Uma curiosidade: O fundador da banda, Marty Balin, era dono de uma casa de shows em San Francisco chamada "The Matrix". Lembram que no filme The Matrix (1999), o herói Neo vai atrás de um tal Coelho Branco que bate na sua porta?

Pra ouvir tranquilo e relaxado.


White Rabbit & Other Hits (1990)

01. It's No Secret
02. Somebody To Love
03. Today
04. White Rabbit
05. Embryonic Journey
06. Crown Of Creation
07. Plastic Fantastic Lover
08. Volunteers

6.2.08

Zumbigo - Zumbigo (2001)


O disco homônimo da banda paulistana Zumbigo tem um peso importante para diversos grupos que estão hoje em evidência no cenário musical independente de São Paulo. Na época, o mercado da música ainda não estava em crise, o Napster era uma novidade e não se via tanta banda independente. Myspace, Trama Virtual e Fotolog então, era papo de louco.

O Zumbigo era formado pelo baterista Chapolin , acompanhado na cozinha pelo baixista Renato mC , com Fabiowski na guitarra e Daniel Padilha no violão e vocal. Hoje, Chapolin é o baterista oficial das bandas Seychelles e Ludov. Fabiowski virou o produtor Fábio Pinc, comanda o estúdio 12 Dólares, os teclados do Mammacadela, acompanha o Ludov no baixo e embala casais e celebridades em suas festas com a S.O.S. Renato mC viaja o Brasil trocando experiências com produtores de todos os gêneros em oficinas de criação musical voltada pra Creative Commons e tocando baixo na banda Heroees e Seychelles. Já o Daniel Padilha cansou de trabalhar com fodões das majors, atirou o sapato no rio, comprou duas passagens pra PQP e foi pra Londres com o seu amor.

Pra mim, nada mudou, continuo fã absoluto de todos eles.

O disco tem a produção do Fernando Lauletta, que depois desse trabalho se manteve um parceiro constante pras bandas que vieram depois do Zumbigo. O álbum é bem coeso, tem boas linhas de baixo - com destaque pra PQP e sua vinheta de abertura, e De Volta Pra lá - guitarras ora swingadas - Lata e Apaga o Fogo - ora com efeitos mais sombrios - Americano - que dão a cara hoje nos trabalhos do Seychelles e Mammacadela.

Como coloquei no post anterior, A Música me Leva abre o disco, e também abriu o caminho pro trabalho de todos. Mesmo sendo o filho único do Zumbigo, foi a trilha sonora de muita balada nas épocas boas da faculdade. Hoje, esse caminho vai cada vez mais consolidado e ainda tem muito chão bom pela frente. Vale mencionar as colaborações pra produção do disco, do guru tecnológico Léo Germani e do artista Marcelo Amp parafusando a barriga da também gurua Leis na capa.

Como consta no encarte, a banda recomenda que se coloque o disco no Napster. Como o Napster ficou pra trás, fica aqui o link pra download do disco. Pop do bão, que é melhor.


Zumbigo (2001)

01. A Música Me Leva
02. PQP
03. Americano
04. De Volta pra Lá
05. Lata
06. Apaga o Fogo
07. Sabinada
08. Lôcô

1.2.08

Origem


Escolhi o título A Música Me Leva por ser um símbolo de um movimento musical de jovens paulistanos que já teve várias formas, e hoje tem mais participantes e agregados do que se poderia imaginar quando tudo surgiu, lá no final do século passado, por volta de 1999. Nomes como Tapete Voador e Amigos do Barley despretensiosamente precederam um grupo chamado Zumbigo. Tempos de pouca responsabilidade.

O nome A Música Me Leva reflete bem minha história, uma vez que sempre fui solto e sem muito rumo nesse mundo, e, como boa cigarra que sou, sempre fui guiado pra onde a música estava. A música sempre foi minha maior companheira, guia e fonte de inspiração. Através dela, dei sentido para o mundo e a vida que vivemos passou a ter nexo.

A Música Me Leva é a primeira faixa do disco do Zumbigo, que embalava festas de faculdades com sucessos do pop nacional em versões muitíssimo bem elaboradas e que teve sucesso entre os frequentadores das baladas nos casarões do Pacaembú, Pompéia e Perdizes.

Naquele tempo, o Renato mC ainda não era argentino e o Fábio Pinc era guitarrista baiano. Foi a época em que a música deixou de ser só diversão e passou a ser o leite das crianças.

Hoje, outros núcleos se juntaram, os nomes dos grupos são outros, alguns alcançaram a fama, a teia aumentou e a autenticidade também. O barulho cresce a cada dia, e se não sabemos até onde esse grupo de artistas e colaboradores vai chegar, podemos dizer que a evolução é contínua. E a cada dia, tudo faz mais sentido.

Em breve, mais sobre o Zumbigo.

Obs.: Acima, Daniel Padilha com seus cubos psicodélicos em foto de Wagner Kiyanitza e/ou Fernão Fortes.